quinta-feira, 14 de abril de 2011

Piloto 1.0 - "Ele"



"Todas as histórias tem um começo, mas nem todas elas chegam a ter um fim."



- ... ele acordou.

   A Dra. Duarte esfregou os olhos algumas vezes antes de encarar a sua assistente, que parecia estar muito aflita. Ela endireitou-se na cadeira, sem pressa, e esticou os braços, espreguiçando-se. Segundo depois, conteve um bocejo, diante da ansiedade crescente da subordinada, e ajeitou o cabelo por trás da orelha. O relógio na parede marcava exatamente três horas da manhã. Tinha sido uma madrugada incomum, sem casos graves ou grandes transtornos. Era uma rara oportunidade para se dar um merecido descanso, deixando outros cuidarem das pequenas ocorrências... Há meses a doutora não tinha uma boa noite de sono. "Droga... Será que nunca vão me deixar descansar? Dormir e sonhar um pouco... Nossa! Ahhh... Como sinto saudades dos sonhos picantes das noites de inverno, das fantasias de quando eu era apenas uma doce adolescente... Mas agora, tudo o que me resta é trabalho, preocupações e mais trabalho! Nunca vou conseguir uma vida amorosa estável desse jeito...", pensou, aborrecida, enquanto se distraía com uma caneta esferográfica, passando-a por entre os dedos. Mas acabou derrubando a caneta no chão, devido ao susto provocado pela voz chiada de sua assistente. Nunca iria se acostumar com esses guinchos.

   - Doutora...! Por favor, diga alguma coisa!

  - Dizer o quê?! Laura, eu não disse para não me pertubarem? Ando muito cansada, eu preciso de uma noite de sono, e de preferência sem nenhum incômodo, entendeu?! - respondeu ela, irritada.

   - Mas... D-Dra. Duarte, a senhora ao menos me escutou? - insistiu Laura. Sua voz chiada conseguira se tornar ainda mais aguda. Isso sim era bastante preocupante. Na verdade, era pertubador.

   - É claro... - a doutora escolhia bem as palavras, ainda aborrecida. - Eu a ouvi, mas como estava um pouco cansada, não tenho certeza do que ouvi... poderia repetir, por favor?

   - Doutora, ele acordou!!! - chiou a assistente, que suava e ofegava copiosamente. A Dra. Duarte deu um largo bocejo.

   - Ele quem, criatura...? Isso é motivo para...
   Então, ela finalmente entendeu. Sua boca permaneceu aberta; seus olhos se arregalaram. A assistente se deu por vencida e desabou na cadeira mais próxima, ainda suando muito.

   - O quê?! Não acredito... Laura! Você está mesmo me dizendo que ele acordou?!! Não pode ser... O paciente "especial"? Aquele garoto?

  Laura confirmou com a cabeça. A doutora estava pálida. "Não pode ser verdade. Isso não está acontecendo". Levantou-se e começou a andar de um lado para o outro da sala. Como queria estar sonhando agora! Como queria que essa chaleira velha não tivesse atrapalhado o seu descanso! "É isso! Isso só pode ser um sonho. Não. É um pesadelo. Logo eu vou acordar, e tudo vai voltar ao normal..." Fechou os olhos e contou até três, desejando com todas as forças...

   Mas, e se não for um pesadelo? E se for a mais pura realidade? Abriu os olhos. Laura ainda estava lá, suando muito, choramingando assustada. "É real... e impossível. Merda, mas que diabos eu devo fazer?!" Essa situação inesperada fugia totalmente dos cálculos. Como única representante do departamento presente, era de sua responsabilidade. Não havia ninguém em quem se apoiar, era a sua cabeça que estava em jogo no momento. "Pense, pense... o que o Dr. Niegson faria?"

   Quando o Dr. Niegson ainda estava a frente do Departamento de Neurologia da Lótus Corp., ele comandava o setor com pulso de ferro. A Dra. Duarte o admirava e o considerava seu mentor, um exemplo a ser seguido. Fora ele quem lhe apontou como sua "sucessora", e isso a envaidecia. "O Doutor não se desesperaria, se estivesse na minha situação. Ele se manteria calmo... Ele agiria. Não se esqueça das instruções, do objetivo principal da experiência... acalme-se!" repetia a Doutora para si mesma. Não podia se deixar levar pelas emoções. "Seja fria. Tem que haver uma explicação, eu só não estou analisando da forma correta..."

   Então, lembrou-se de uma informação muito importante. Depois de se certificar que seus cálculos jamais poderiam estar errados, o Dr. Niegson ordenou-lhe, antes de ser transferido, a comunicar-se diretamente com ele, caso ocorresse algo fora do padrão. "Por menor que seja o fator, não podemos deixar nada alterar o planejamento do experimento. Não se preocupe, Amélia, isso é apenas uma garantia. Se alguma coisa acontecer e você não souber o que fazer, ligue diretamente para esse número. Nós cuidaremos do resto", dissera, com firmeza. Era um número de celular, talvez o seu número pessoal. "Devo ligar?", ponderou a Doutora. Naquela época, sempre desejou ter um motivo qualquer para falar com ele... É interessante ver como as coisas mudam.

   Resolveu ligar. Se alguém podia acalmá-la, era ele. Já se imaginava mais tranquila ao ouvir que estava tudo bem, que ela não precisava se preocupar. Mesmo assim, não conseguiu conter o nervosismo, enquanto esperava que ele atendesse. Não seria melhor desligar? "Laura pode ter se enganado, eu não deveria incomodá-lo sem ter certeza absoluta do fato...". Antes que pudesse averiguar, porém, ouviu a voz dele do outro lado da linha.

- Alô?

   Entre falar e calar-se, a Doutora acabou se engasgando. Só agora percebera que ligara diretamente do seu celular. Agora tinha que ir até o fim.

- Dr. Niegson, d-desculpe incomodá-lo a essa hora...

- Amélia? É você? - perguntou ele. - Eu te disse para ligar apenas se algo importante tivesse ocorrido... o que houve? - o tom de voz dele parecia preocupado, bem diferente do que ela esperava. Ela hesitou. Depois de alguns segundos em silêncio, disse:

- ... ele acordou.

Perfil - Ressuscitando o Blog


"Phoenix Down*, já!"

   Depois de um hiato de três meses, aqui estou eu, numa tentativa épica de ressuscitar o Setor 3 e mantê-lo atualizado mensalmente! Peço desculpas aos meus poucos leitores pelo abandono, mas prometo tratar este espaço com mais zelo daqui em diante.
   Ah, e temos novidades! Estarei postando aqui alguns textos que servirão (ou não) como rascunhos para projetos futuros. E não é só isso. Novos ensaios sairão do forno, assim como novos especiais; continuarei a escrever os prólogos (estagnados desde o distante Prólogo I, lembram?) e outras seções terão mais destaque... Enfim, aguardem os próximos posts. Espero que curtam.

P.s.: Ah, estou estudando criar um novo layout para o Blog... alguma sugestão?

*Para quem não entendeu, é um item medicinal da série FF. Dar mais detalhes estragaria a piada... entende? xD

Imagem do título: Phoenix Down by Athenazero-d1natzh




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