quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Ensaio 0.3 - Paraíso


Ele abriu os olhos, suspirou e voltou sua atenção para os céus... tentando enxergar além das nuvens. Então, se ouviu um murmúrio, vindo das águas mais profundas que circundam o abismo chamado coração:

"Ainda que eu falasse a língua dos anjos...
eu jamais poderia traduzir em palavras o quanto você é importante para mim.
Ainda que eu cruze os portões do paraíso...
eu jamais poderia conhecer a felicidade longe de ti."

- de um mortal, um pobre pecador.

(...)

_____________________________________________ 
I

  As portas da igreja estão abertas para a noite. Lá fora, a terrível tempestade continua a desabar impiedosamente, como em uma alusão ao meu sofrimento. O ruído característico dos pingos e os estrondos ensurdecedores dos trovões ecoam em meus ouvidos, amplificados pela acústica do salão. Estou além da penumbra, diante do altar, imóvel, indeciso, incapaz. Vez ou outra, os clarões dos relâmpagos revelam os detalhes da arquitetura barroca, bem como a simplicidade das acomodações, a beleza dos afrescos, as imagens suntuosas dos santos... meras impressões artísticas maltratadas pelo tempo, todas sufocadas pelo estranho sentimento de solidão presente no local. Algo está errado... Não me sinto amparado ou tranquilizado, não consigo abrir meu coração para Deus. É horrível. Sou a maior vítima de meu ceticismo niilista... Fico inconscientemente me perguntando: será que minhas preces chegarão até Ele? Eu teria fé suficiente? Não posso me entregar à dúvida ou ao desespero: preciso encontrar uma resposta, preciso descobrir o caminho certo. Mas seria possível para mim?
   - Eu nem sei por onde começar... - murmuro para mim mesmo. Ergo a cabeça, e meus olhos fitam a abóboda do salão, onde dezenas de anjos foram retratados habilmente pela imaginação do artista. É uma bela pintura, mas... Não corresponde à realidade. Lembro da luz dos olhos dela, da sua voz, da sua beleza implacável. Lembro da sua atitude, das suas palavras, da sua personalidade única. Lembro do seu abraço, do seu beijo, do calor humano. Lembro de sua essência indefinível... Quem quer que tenha pintado aqueles afrescos, jamais conseguiria captar a forma primordial, a centelha invisível que eu consegui enxergar quando a vi completamente naquela noite, pela primeira vez. Nem todas as cores, nuances e texturas poderiam descrever o quão magnifica é a verdadeira face de um anjo...
   - Eu a amo... - murmuro para mim mesmo, e a medida que repito estas simples palavras, a idéia escapa de um tímido sussurro para soar claramente, em alto e bom tom, se sobressaindo aos ruídos angustiantes da tormenta, de modo que o mundo inteiro possa ouvir - Eu a amo, eu a amo, eu a amo!!! Essa é a única resposta para as inquietações em meu coração. Agora sei, tenho certeza, não posso negar esse sentimento. Por isso...
  - Deus, por favor, peço-Te, com toda a minha fé, ainda que não seja forte o suficiente, que me ajude a reencontrá-la...!
  Um clarão, muito mais longo do que os outros, iluminou o salão, seguido de um ribombar alto, como se um milhão de trombetas respondessem em confirmação às minhas preces... Seria verdade?
(...)
   - Quem está aí? - perguntou de repente uma voz rouca, vinda da escuridão.
  Assustado, voltei-me para a esquerda, de onde a voz tinha saído. Um pequeno ponto de luz caminhava a passos lentos em minha direção, cada vez maior e mais próximo. Segundos depois, pude ver a silhueta de um padre gorducho, iluminada pela luz bruxuleante de um velho lampião. Apesar do frio, ele suava muito, e pelo jeito que sua mão tremia, parecia estar mais assustado que eu.
   -Q-q-quem é você? O q-que você está fazendo aqui? - gaguejou ele. - Seus vândalos, eu já não disse para nunca mais voltarem aqui? Então não se contentaram em roubar as imagens do altar?!
  - Me desculpe, senhor, mas eu não estava roubando nada...! Pensei que não havia ninguém aqui... - me apressei em responder. - As portas estavam destrancadas e resolvi me abrigar aqui, até que a tempestade passasse... Sinto muito, achei que estivesse sozinho...
  Ele ofegava um pouco, tenso, e me fitou dos pés a cabeça, erguendo a sobrancelha, como se estivesse analisando o meu caráter através da minha aparência (que no momento, infelizmente, não era das melhores). Após enxugar o suor da testa na manga das vestes, o padre gorducho perguntou novamente:
  - O que você estava fazendo aqui, diante do altar? Qual eram as suas intenções hein? Tem certeza de que não está mancomunado com aqueles marginais?- ele fechou a cara, segurando o lampião com firmeza, ainda temeroso. - Seus vândalos, vocês não perdoam nem mesmo o templo de Deus? Esse é um lugar sagrado! Deviam se envergonhar de seus pecados, uns rapazes tão jovens...
  - Não é nada disso, senhor! Seja lá o que geralmente fazem por aqui - o que definitivamente é um desrespeito! -  juro que não sou um desses vândalos. Estou falando a verdade, entrei aqui por causa da chuva, pensei que o lugar estava abandonado, pensei que estivesse sozinho... Só queria me abrigar contra a tempestade!
   Ele mordeu o lábio inferior e se pôs a me olhar longa e profundamente. As rugas em seu rosto aos poucos se suavizaram, e então ele falou:
  - Ah, é mesmo? Pois saiba que as juras tem poder! Em todo o caso... Eu também pensei que estivesse sozinho, mas você está aqui, não é?! E, realmente, não tenho culpa do templo estar nesse estado, mas está longe de ser considerado um local abandonado, não acha? Se bem que essas goteiras não colaboram em nada... - acrescentou ele, apontando para algumas infiltrações no teto principal.
  - Claro... Me desculpe, senhor padre. Espero que não me julgue mal. - e sorri, hesitante. Ele parecia mais calmo, mas ainda estava bem desconfiado. Resolvi sair do local, antes que ele mudasse de idéia a meu respeito.
  - Eu não quero incomodá-lo, por isso já estou indo...
  - Hummm... Nada disso. - interrompeu ele, sério. - Você mesmo disse que estava se abrigando aqui por conta da tempestade, não disse? Ora, então fique! Você pode aproveitar e me ajudar a dar um jeito nessas goteiras, não é? Pelo menos, podíamos reparar as da sacristia, que estão me incomodando muito...
  Surpreso, fiquei em silêncio, sem saber o que responder. Ele então retomou a palavra, perguntando:
  - A não ser... que você tenha mentido e esteja desconfortável com a idéia, seria isso? Jurou em falso, por acaso?
  - Não... não menti! Mas...
  - Então, é melhor ficar. - determinou ele. - Além do mais, você interrompeu a ceia...  bom, tem o bastante para nós dois, se estiver com fome.
  Ele me encarou, decidido. Diante do argumento, não vi problema em ficar... afinal, a tempestade ainda desabava lá fora. E eu estava morrendo de fome...
  - Obrigado, ficarei.
  - Ótimo, emtão me acompanhe, rapaz!

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II

  Estávamos em um cômodo mal iluminado, provavelmente o local onde ele ceiava, antes de me descobrir. Meu estômago estava indignado de tanta fome e anunciou a sua revolta, em um brado alto. Percebendo o meu embaraço, o padre ofereceu um pedaço de pão, uma fatia de queijo e um copo de vinho. Devorei tudo sem pressa, dando grandes goladas no saboroso líquido vindo do fruto da uva. Enquanto eu comia, o padre falava e falava, desabafando suas mágoas:
   - Não temos verba para a reforma da Igreja. Se fosse em outros tempos... as pessoas se importavam mais. Esse lugar é um patrimônio histórico! Isso deve valer alguma coisa, não acha? - e sem me dar tempo para responder, continuou: - Eu acho o seguinte: a prefeitura, o povo, o bispo ou até mesmo o santo Papa: alguém deveria tomar uma atitude ao invés de nos deixar cair aos pedaços! - esbravejou ele. - Bom, talvez eu esteja exagerando um pouco... - acrescentou, pensativo. - Mas, olhe só essas goteiras! Está vendo isso?! Que absurdo! Logo irão inundar a sacristia! - e bateu na mesa com força.
   Concordei, alarmado. Para a minha sorte, ele continuou despejando suas queixas, mesmo depois de terminada a refeição. Eu preferia apenas concordar com ele, quase não falava. Meia hora depois, notei os ruídos da chuva lá fora mais brandos, de modo que pensei em ir embora.
  - Obrigado pela refeição. - comecei, aproveitando uma pausa do padre gorducho. - De qualquer forma, me desculpe. Não queria incomodá-lo. Eu só me aproximei do altar porque... porque eu precisava de uma resposta... Enfim, eu estava apenas tentando... bom, esqueça. Me desculpe. Espero que tenha acreditado em mim. Ah, parece que a chuva finalmente estiou. Até logo, então. - dito isto, me levantei, e fui caminhando até a porta da sacristia, um tanto frustrado.
  - Espere! Para que tanta pressa, meu rapaz? - chamou ele. - Por acaso não achou mesmo que eu iria fazê-lo reparar essas goteiras todas?! Estava apenas lhe testando, meu caro, era apenas uma brincadeira! Fique mais um pouco; não sei o porquê, mas gostei de sua companhia.
  Parei e me virei para encará-lo, surpreso. Ele então começou, em um tom mais sereno. - Não precisa se alarmar, meu jovem. Eu só gostaria de ouví-lo, já que fiquei por toda a ceia falando e falando, sem me dar conta. Ao vê-lo agora, bem... tenho um estranho pressentimento de que talvez você esteja precisando de ajuda.
  Ainda o encarei, atônito. Era tão transparente assim, o meu estado de espírito?
  - Apesar de você ter entrado aqui sem permissão, e de eu não saber quais eram suas reais intenções, eu sinto que é a minha obrigação tentar ajudá-lo. Sinto ter falado tanto, acho que acabei lhe aborrecendo. Gostaria de me acompanhar até o confessionário? Desabafar poderia ser de grande auxílio, rapaz.
  Hesitei. Mas que papo era esse agora? Parecia ser uma pessoa totalmente diferente falando comigo... Toda aquela segurança, parecendo adivinhar o que eu estava sentindo... Seria o que chamavam de inspiração divina? Pensei um pouco, até que finalmente respondi:
  - Tudo bem.
  Então, acompanhei aquele estranho padre gorducho ao confessionário, esperando que ele talvez pudesse me ajudar, temendo apenas que o homem não sofresse de algum distúrbio de polaridade... ou coisa do tipo. Mas eu ainda era um incrédulo sobre as formas pelas quais Deus pode agir...

* * *

  - Apaixonado por um anjo? - perguntou o padre, incrédulo. - E você acha que... a única forma de reencontrá-la é indo até o Paraíso? É isso?
  Estávamos já há algum tempo no confessionário, mas meu depoimento parecia não convencê-lo. Pelo contrário: ele começou a ficar aborrecido, talvez pensando que eu estava zombando de sua ajuda.
  - Sim. Eu acredito que seja a única forma. - respondi. - Procurei por ela em todos os lugares, mas não a encontrei.
  - O que você quer dizer? Está falando metaforicamente, não é, rapaz? É isso?
  - Não. Não é uma metáfora... Ela é um anjo. Eu sei. Infelizmente, ela desapareceu e...
  - Entendo...! - interrompeu ele, surpreso. - Eu pensei que estivesse com problemas, rapaz. Mas, pelo visto, você não sabe em que nível de problemas você se meteu, não é? É melhor estar falando sério, pois eu sou um homem de Deus! Não brinque com anjos ou assuntos desse tipo, onde já se viu isso?
  - Mas, padre, é verdade! Eu realmente a vi...! Ela...
  - Basta! Me fale qual é o seu verdadeiro problema, pare de fugir dessa forma, garoto! Não posso ajudá-lo se continuar inventando histórias mirabolantes como essas!
  Me calei, e dei um longo suspiro.
  - É incrível como nem mesmo o senhor é capaz de acreditar em mim... - recomecei. - Mas eu sei o que vi, o que vivenciei. Ela realmente era... enfim, esqueça.
  Dessa vez foi ele que fez uma pausa. Sem pensar, saí do cubículo, chateado. Logo, ele também saiu, enxugando o suor da testa na manga das vestes, nervoso.
  - Espere, rapaz. Eu... acredito em você. Mas eu precisava ter certeza... - ele ergueu a sobrancelha, desconfiado. - Você me dá a sua palavra? Não me censure, pois eu tenho os meus motivos. - acrescentou ele, ao ver meu olhar.
  - Sim, mas é claro. Não tenho porque mentir.
  - Entendo... - ele suspirou, preocupado. - Então, o que aconteceu? Me explique. - pediu ele.
  - Ela me salvou. - falei, sem esperar que ele realmente acreditasse. - Então, eu a vi, como ela era de verdade, entende? Eu pude enxergar sua essência. Eu não queria, mas não consegui resistir: acabei me entregando totalmente...
  - Então, você quer dizer que se apaixonou de verdade por ela?
  - Sim.
  - E você também falou sobre um milagre... poderia descrevê-lo?
 - É impossível. Mesmo se o senhor estivesse lá, no exato momento, não poderia compreender o que aconteceu... Nem mesmo eu compreendo.
  - E então? O que houve?
 - Eu já disse. Após aquela noite, passamos alguns poucos momentos juntos, até que ela desapareceu, sem nenhuma explicação. Acho que sou o culpado por isso, mas não consigo entender...
   Fiz mais uma pausa e perguntei, frustrado:
   - Me diga, padre: qual é o caminho mais rápido para o Paraíso?
  Ele parecia surpreso com a pergunta.
  - Bom... você deve se arrepender de seus pecados, primeiramente. É por isso que eu digo: esqueça esse delírio, essa história. Não vai te levar a nada. - e continuou, sem me deixar responder. - Escute: os anjos não devem se relacionar desta forma com os mortais, rapaz. Isso não é natural, é uma relação sem futuro, impossível. E, se fosse possível, por algum estranho e desastroso milagre: seria um pecado terrível desviá-la dos desígnios divinos... e a ti, o que dizer de seus próprios propósitos? É isso que você quer?
  - Eu a amo...! O que devo fazer, então?
  - Rapaz... você realmente acredita nesse amor? - perguntou ele, o rosto agora expressando preocupação.
  - Mas é claro! Por que não acreditaria...? - retruquei, aborrecido.
 - Sei... Infelizmente, acho que sei a melhor forma de ajudá-lo. Eu tenho um amigo de infância que é psicólogo, ele tem uma clínica no centro da cidade e...
  - Para um padre, falta-lhe fé. - disse secamente. - Não consegue enxergar a verdade em meus olhos?!
  Antes que ele pudesse responder, saí da sala, indo em direção ao salão principal. Estava quase nas portas de entrada quando ele me alcançou.
  - Rapaz, espere!
  Olhei para trás, furioso.
  - Você não entende, padre. Eu não quero impedí-la de seguir seu caminho, nem pretendo me desviar do meu. Minhas atitudes não são egoístas, muito menos meus sentimentos. Eu simplesmente acredito que a encontrei naquela noite por alguma razão sublime. Preciso descobrir o que aconteceu! Ela me salvou do abismo, e agora, temo que ela esteja se punindo por isso. Tenho de encontrá-la mais uma vez! Talvez eu possa ajudá-la, de alguma forma. Mesmo que tenha que ir até os portões do Paraíso... ou às profundezas do Inferno. Não vou desistir, pois acho que esse seja o verdadeiro propósito por trás da minha existência!
  Ele me olhou, uma mistura de temor e admiração. Parecia não acreditar no que estava ouvindo, mas ao mesmo tempo, um sorriso lhe escapava dos lábios.
  - Você tem muita fé. - declarou ele, inesperadamente. - Mas talvez, nessa ânsia de encontrá-la e, como diz, salvá-la, você acabe se perdendo.
  O encarei, espantado com o argumento.
  - Não se preocupe. Não vou deixar isso acontecer novamente.
  - Não deveria alimentar essa loucura, rapaz. Mas, se quer mesmo saber, algo me diz para acreditar nessa sua fábula romântica. Apesar de estar indo contra os meus princípios...
  Ele sorriu, e se aproximou lentamente.
  - Eu, mais do que ninguém, posso entender o que você sente. Porque eu... eu sou um anjo!
  - O quê?! - exclamei. - Acho que não ouvi direito...
  - Na verdade, eu fui um anjo. Mas isso é uma outra história... Enfim, o que posso dizer é que não acabou bem, para ambos. - ele então começou a falar rapidamente, como se temesse que a coragem de revelar seu passado se esvaisse. - Eu fui um covarde, um fraco, um tolo, e neguei a responsabilidade que me foi incumbida. E acabei me apaixonando... por ela. Eu deixei que ela sucumbisse, mas não posso permitir que você cometa os mesmos erros, meu rapaz. Não posso!
  - Eu não estou entendendo... o que o senhor quer dizer com isso? - perguntei, ainda sem acreditar no que estava ouvindo.
  - Meu rapaz... todos têm o direito de fazer uma escolha. Até mesmo os anjos... e você não é exceção. Se lutar por esse amor, certamente se perderá... Teria você fé suficiente nesse sentimento, a ponto de percorrer os mais árduos caminhos e as mais tortuosas estradas, atravessando até mesmo o Inferno, afim de vê-la uma vez mais? Você terá de sacrificar tudo, e nem assim existem garantias de que irá salvá-la. Pois eu lhe garanto: ela corre um grave perigo; e já não pode ser chamada de anjo, como eu.
  - Não me importam os riscos, pois sei que conseguirei. E jamais desistirei, mesmo que mergulhe nas profundezas do Inferno para reencontrá-la; seguiremos de mãos dadas a caminho do Paraíso! Isso é uma promessa!
  O padre, ou anjo, me olhou admirado.
  - O verdadeiro caminho para o Paraíso - sussurrou ele, a um palmo de distância. - começa dentro de si mesmo. Conhece-te, aprende com teus erros, persista na sua fé; assim, um dia, você entenderá o que realmente importa. Lembre-se: o maior inimigo que encontrarás é a ti mesmo. Deus te abençoe, rapaz. Que Ele possa te amparar e auxiliar na estrada que escolheste!
  Eu sorri, impressionado com a atitude, e o agradeci.
  - Obrigado, padre. Muito obrigado pelas palavras. Então... até logo. Nos reencontraremos um dia, tenho certeza. - Ele riu, contente:
  - Acredito nisso! Você é feito de uma fibra mais resistente do que imaginas. Confia!
  Depois da breve despedida, seguimos pelo mesmo salão em cuja abóbada estavam retratados os anjos em deleite no paraíso. Abri as portas de carvalho, cumprimentei mais uma vez o padre, e segui meu caminho, sem olhar para trás. Lá fora, a garoa persistia, mas não chegava a lembrar a terrível tempestade da véspera.
  - Esse rapaz é louco... - murmurou o padre, quando já me perdia de vista. - Mas, talvez, um louco tenha mais chances de chegar ao Paraíso do que todos os sábios do mundo, não é?
 

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III

  Caminho pela orla, pensativo. A chuva há muito passara; à minha direita, os raios de sol começam a surgir do horizonte, redefinindo as cores da paisagem. Dou um leve sorriso. Fecho os olhos e sinto a brisa tocar suavemente o meu rosto.

* * *

   Ele abriu os olhos, suspirou e voltou sua atenção para os céus... tentando enxergar além das nuvens. Então, se ouviu um murmúrio, vindo das águas mais profundas que circundam o abismo chamado coração:


"Ainda que eu falasse a língua dos anjos...
eu jamais poderia traduzir em palavras o quanto você é importante para mim.
Ainda que eu cruze os portões do paraíso...
eu jamais poderia conhecer a felicidade longe de ti."

  Era apenas um mortal, um mero pecador. Mas, aos meus olhos, ele era...
 

**Dedicado a todos os pecadores que, por um grande amor, trilharam o caminho do Paraíso... e do Inferno.**

(Next: Ensaio 0.4 - Werneck)

Image: Heaven's Door by 'bosniak - on Deviantart


Um comentário:

  1. Muito bom Sr. Amaral! Sempre me surpreendendo eu não esperava esse desfecho, mas ficou muito bom ^^
    valeu pela divulgação.Eu divulguei teu blog junto com o meu em duas comunidades do orkut!
    Continue assim brother
    o meu grande incentivo de escrever foi você velho.

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